Da revista "Galileu"
- por Paola Bello
Com seu ar enigmático, ele já foi associado a deuses e demônios ao longo da história. Hoje, após milênios de convivência com o homem, o bichano é o animal de estimação mais adaptado à vida moderna e um aliado considerável na hora de cuidarmos da nossa saúde.
Dona Luiza, 65 anos, ficou viúva neste ano. Para piorar, não podia contar com o apoio dos filhos, que viviam distantes dela, física e afetivamente. Por conta disso, além de tremores nas mãos, passou a ter problemas estomacais, enxaquecas e dores musculares. Mesmo nesse estado, ela teve disposição para recolher um gato que fora atropelado na rua onde mora. O que era apenas um ato de solidariedade acabou virando uma estratégia que, em vez de uma vida, pode estar salvando duas.
Entre as idas e vindas ao veterinário, ela e o gatinho vira-lata começaram a participar de sessões de zooterapia. Nelas, percebeu que, ao assumir a responsabilidade de manter o animal vivo e bem cuidado, dona Luiza exigia saúde e bem-estar de si mesma. Em conseqüência, conseguiu purgar a perda do marido e resgatou o relacionamento com os filhos.
Casos como esse entram para a contabilidade que está ajudando os felinos a atenuar o estigma de interesseiros e anti-sociais. Com isso, ganham mais espaço nos lares. No Brasil, eles são um para cada 12 habitantes - há um cachorro para cada 6 brasileiros. Entretanto, veterinários, zooterapeutas e o mercado de alimentos para animais apostam na tendência de o gato se tornar o animal do futuro. Pudera, as famílias estão se tornando menos numerosas, os lares estão cada vez menores, e as pessoas estão passando muito menos tempo em casa. Se há um bicho que consegue se adaptar bem a esse quadro, é o gato, que vem dividindo o ambiente com os humanos há muito tempo.
Apesar do temperamento de caçador
solitário, o gato aprecia a proximidade com os humanos. Quando o homem começou a procurar um local para chamar de lar, lá
estava o gato. Logo que desenvolveu a agricultura - entre 10.000 e 12.000 a.C.
-, deixou de ser nômade e começou a estreitar os laços de amizade com os
felinos. E tudo teve início como uma troca de favores: o homem passou a
armazenar alimento; com a estocagem de grãos, vieram os roedores, que, por sua
vez, atraíram os gatos. O mais antigo fóssil que comprova essa amizade é de
9.500 a.C. Descoberta em 2004, a ossada de um gato selvagem dividia a tumba com
a de um humano. O achado derruba a tese de que os egípcios teriam sido os
pioneiros na domesticação dos felinos, em aproximadamente 2000 a.C., já que o
fóssil foi encontrado na ilha mediterrânea de Chipre.
Pelo tamanho da ossada, o primeiro amigo felino não devia ter mais de 8 meses de vida, o que indica que teria sido morto para acompanhar a dona após a morte. Porém, o indício mais forte da amizade consiste no fato de que, nenhum gato, de espécie alguma, é nativo da ilha de Chipre. Para a existência desse fóssil, a hipótese mais provável é a de que os próprios moradores da ilha viajaram cerca de 70 quilômetros, até a Turquia, onde adquiriram o animal e o levaram para a vila.
"Pesquisando os componentes genéticos de gatos selvagens da Europa, da Ásia, da África e do Oriente Médio, concluímos que realmente a domesticação começou na ilha de Chipre, com gatos provenientes do Crescente Fértil [região entre os rios Nilo, Tigre e Eufrates, onde iniciou a agricultura]", afirma Stephen O'Brien, chefe do laboratório de diversidade genômica no Instituto Nacional do Câncer, em Maryland, EUA.
De deuses a demônios
Séculos de convivência - e o ar enigmático dos felinos - fizeram com que, além de aliados, os gatos passassem a ser considerados um canal para diálogos com o divino. "No Antigo Egito, acreditava-se que eles tinham propriedades espirituais e que eram capazes de se comunicar com divindades", diz Elaine Evans, professora da Universidade do Tennessee e curadora do museu McClung (no campus da universidade, em Knoxville), que desde 2001 abriga uma exposição de gatos mumificados.
No início, os egípcios cultuavam os leões. O gato selvagem, que mais parecia um leão em miniatura, começou a ser introduzido na mitologia. Assim, os deuses passaram a ganhar atributos e temperamentos ainda ligados aos leões, mas adaptados ao comportamento dos bichanos. "O gato representa a civilização, relação feita a partir da agricultura. Também representa o Sol, por ficar bastante tempo deitado na areia se bronzeando. Essas características foram atribuídas ao deus-sol Rê, metade homem, metade gato", afirma Antonio Brancaglion Jr., egiptólogo e professor no Museu Nacional do Rio de Janeiro.
Quem mandou? A Inquisição condenou os gatos à morte. A Europa pagou caro por isso, pois, proliferando à vontade, os ratos disseminaram a "peste negra"
Com a popularização dos rituais fúnebres envolvendo a mumificação, os gatos passaram a acompanhar seus donos até a eternidade. A mais antiga múmia de gato conhecida data de 1.500 a.C. Apenas na cidade de Beni-Hassan, na margem leste do rio Nilo, mais de 300 mil múmias felinas foram encontradas. Também há registros de cemitérios gigantescos nos arredores do Cairo, com mais de 4 milhões de gatos mumificados.
Essa aura de adoração não ficou enterrada nas tumbas egípcias. Séculos depois, nas comunidades gregas e romanas, eram comuns imagens e cultos às deusas Háthor e Bastet. Baseados nessas duas divindades, os gregos também transferiram ao gato alguns atributos de Afrodite, a deusa do amor e do prazer sexual, e associaram a agilidade e a rapidez dos bichanos para a fuga a Ártemis, a deusa da caça. Da mesma forma, os romanos associaram a feminilidade felina à deusa Diana, da caça e da fecundidade, e relacionavam o bichano à deusa Vênus, da sensualidade e das emoções maternas.
Já na era cristã, a Inquisição veio para pôr um fim na paz entre humanos, gatos e divindades. "O bichano só começou a ser visto de forma negativa a partir do cristianismo, na Idade Média. Essa ligação maligna foi feita justamente porque era um animal atribuído aos deuses pagãos. Com a Inquisição, tudo que não era da religião católica era do mal e deveria ser queimado na fogueira", afirma Brancaglion. Profissões que tinham qualquer ligação com o gato também foram condenadas. As parteiras, por exemplo, usavam a deusa Bastet como símbolo e, por isso, foram tachadas de bruxas. No século 13, a perseguição foi ainda maior. Com a promulgação de bulas nas quais condenava os gatos, especialmente os de cor preta, associado ao satanismo, o papa Gregório IX determinou a exterminação de centenas de felinos.
A humanidade pagou caro por esse destempero da Inquisição. Com a redução da população felina, os ratos tomaram conta do pedaço. Falta de saneamento, condições precárias de higiene e tráfego de navios infestados de roedores ajudaram a deixar o século 14 marcado na Europa pela pandemia da peste bubônica. Transmitida através da picada de pulgas infectadas por ratos doentes, a "peste negra" dizimou cerca de um terço da população européia.
Se sob o catolicismo os gatos conheciam dias de cão, na cultura islâmica há relatos de que a vida de Maomé teria sido salva por seu felino de estimação. "Conta-se que o profeta estava em casa, e, sem que ele percebesse, uma cobra se aproximou para atacá-lo. Seu gato conseguiu matá-la antes do bote. Também fala-se que o profeta o teria acariciado na cabeça e o abençoado, e que, por isso, a partir daquele dia, os gatos começaram a cair sempre em pé", diz Brancaglion.
A amizade felina também influenciou a cultura nipônica. No Japão, o gato Maneki-Neko (aquele das boas-vindas, com uma das patinhas levantada) é símbolo de boa sorte. Reza a lenda que, há muitos anos, esse gato estava parado na frente do templo de Gotoku-ji. Ao ver um senhor feudal, teria acenado e atraído o homem para dentro, livrando-o de um raio que cairia logo depois. A partir desse dia, Maneki-Neko passou a ser considerado a encarnação da deusa da misericórdia.
O SWING DO
BICHANO
Linguagem corporal dá dica do que se passa no coração e na mente do animal:
1>>>Balançar
a cauda - Ao fazer isso, um gato não está
demonstrando alegria. Muito pelo contrário. Significa que está incomodado com
alguma coisa ou pronto para o ataque. Por outro lado, também pode estar
satisfeito com o seu dono, isso acontece quando o elogiamos.
2>>>Massagear - O gato pressiona superfícies e movimenta as patas. Em geral, demonstra
satisfação e contentamento. Filhotes fazem isso enquanto mamam.
3>>>Rolar - Indica tanto que o gato não tem a intenção de atacar quanto que está submisso, embora a submissão felina indique mais afeição que obediência.
4>>>Esfregar-se - Expressa afeição e demarcação de território. O contato quase direto com a pele faz com que o cheiro do bichano fique impregnado onde quer que ele se esfregue.
5>>>Movimentar orelhas - A posição dos órgãos indica a vontade de participar das situações. Altas e viradas na direção do que está acontecendo, indicam interesse. Baixas e viradas para o lado oposto do movimento ou som demonstram indiferença.
6>>>Miar - Há dezenas de miados. Variam de acordo com a situação e a intenção. Os mais longos e crescentes costumam indicar felicidade, os mais agudos e estridentes podem ser sinal de uma briga com outro gato.
7>>>Ronronar - Quando afagados, os gatos ronronam para demonstrar deleite e reciprocidade.
8>>>Morder ou mordiscar - Serve para demonstrar afeto, agredir ou brincar. A que indica afeto costuma ser a mais delicada e ocorre enquanto o gato recebe carinho ou sente prazer com a companhia.
Os Mutantes
Os gatos não contam apenas com aspectos etéreos como justificativa para terem virado um dos animais de estimação mais comuns no mundo. A ciência também tem seu papel. As mutações genéticas favoreceram o aumento na aceitação do bichano. Por meio de reproduções monitoradas, novas raças são desenvolvidas. "Há gatos como os da raça sphynx, que não possuem pêlos. Essa mutação foi mantida intencionalmente e virou uma opção para pessoas alérgicas", diz a médica veterinária Maria de Fátima Martins, professora na USP e especialista em zooterapia.
As mutações têm se mostrado eficazes na hora de mudar a forma, mas ficam devendo quanto ao conteúdo. Para Nicholas Dodman, especialista em comportamento animal e autor do livro "The Cat Who Cried for Help" ("O Gato que Gritou por Socorro", ainda sem tradução para o português), apesar de todo o histórico de convívio, nenhuma raça foi totalmente domesticada. "A razão pela qual os gatos nos toleram é que eles são criados por humanos desde pequenos. O período crítico de socialização é entre duas e sete semanas, fase na qual são moldados por nós. Gatos que viveram esse período sem contato com humanos nunca se sentirão confortáveis na presença de pessoas."
Já para a professora primária Kathy Hoopmann, autora de uma série de livros sobre comportamento infantil, a amizade com os gatos é possível, mas exige cuidados. Em seu livro "All Cats Have Asperger Syndrome" ("Todos os Gatos Têm Síndrome de Asperger", sem tradução para o português), ela compara os bichos a portadores da síndrome, caracterizada pela dificuldade no convívio social, mas sem afetar a parte cognitiva. "Pessoas com Asperger têm problemas em quatro áreas principais: comunicação, interação social e emocional, sentidos sensoriais e adaptação a mudanças. Os gatos dividem os mesmos traços. Não são animais sociáveis, tendem a escolher 'amigos' com cuidado."
MÁQUINA
MORTÍFERA
Visão, audição e olfato aguçam o instinto fatal dos bichanos: trucidar presas:
Orelhas>>>As
orelhas dos gatos são instrumentos de audição e de equilíbrio. Enquanto humanos
possuem seis músculos auriculares, os gatos têm 30, o que permite que movam as
orelhas de forma independente. Isso facilita a identificação das fontes sonoras.
Órgão de Jacobson>>>Como outros
mamíferos e a maioria dos anfíbios, os gatos possuem órgão vomeronasal, ou de
Jacobson. Ele auxilia na percepção de odores e feromônios. Como o órgão fica no
céu da boca, o gato contrai nariz e lábios para aspirar com mais intensidade.
Olhos>>>Adeptos de hábitos noturnos, os felinos possuem visão privilegiada. Não
enxergam em escuridão total, mas vêem perfeitamente em ambientes com até um
sexto da luz necessária para a visão humana. Isso se deve a uma membrana
localizada atrás da retina. Ela age como um espelho e aumenta a reflexão da luz
dentro do olho, ampliando a capacidade de visão.
Cauda>>>Cerca de 10%
dos ossos dos gatos estão nela. Observa-se em alguns felinos, como o guepardo,
que a posição da cauda favorece movimentos durante as caçadas. Tanto para
ganhar velocidade (quando alinhada ao corpo, diminuindo a resistência do ar),
quanto no equilíbrio (esticada para o lado oposto ao de uma curva), a cauda
favorece a manutenção do equilíbrio sem perda de velocidade.
Nariz>>>Enquanto
humanos têm cerca de cinco milhões de células receptoras, os gatos contam com
19 milhões. Associado à visão e à audição, o olfato é uma importante arma para
identificar presas e inimigos a distâncias consideráveis.
Boca>>>Carnívoros,
os gatos possuem dentes desenvolvidos para matar e comer as presas. Os caninos
são bem maiores que os demais, e os molares são pontiagudos, para destroçar a
carne em pedaços fáceis de engolir. Na fase adulta, o gato possui 30 dentes
permanentes. A língua é bem mais áspera e menos úmida que a de um cão. Essa
característica ajuda a desprender com mais facilidade a carne dos ossos das
presas.
Bigodes>>>Gatos
possuem alguns pêlos diferenciados, mais longos e espessos, chamados de
vibrissae ou pêlos táteis. Esses "bigodes" estão localizados na face,
nas sobrancelhas e atrás das patas dianteiras. São compostos por material
inerte e não contêm nervos, mas possuem células receptoras associadas a eles.
São diferenciados dos outros pêlos do animal principalmente por possuírem
cápsulas sangüíneas ligadas aos folículos, próximos à base de nascimento. Por
serem extremamente sensíveis, esses pêlos auxiliam tanto na identificação de
alguma presa quanto na percepção de espaço e direção.
Unhas>>>Para eles, a principal utilidade das unhas é a defesa. Além de utilizá-las para um ataque ou caçada, os felinos desenvolveram, ao longo da evolução, a capacidade de retraí-las. Essa característica evita que se desgastem com o caminhar e ajuda a mantê-las sempre afiadas.
Unhas>>>Para eles, a principal utilidade das unhas é a defesa. Além de utilizá-las para um ataque ou caçada, os felinos desenvolveram, ao longo da evolução, a capacidade de retraí-las. Essa característica evita que se desgastem com o caminhar e ajuda a mantê-las sempre afiadas.
Mesmo com essas peculiaridades, a amizade entre humanos e felinos é totalmente possível. Quando feita gradativamente, respeitando os limites dados pelo animal, a aproximação pode fazer dos gatos bichos dóceis e sociáveis. Uma forma fácil de interação é a observação da linguagem corporal. "Esfregar a cabeça, por exemplo, é um sinal de afeto, do mesmo modo que o piscar enquanto olha para alguém. Miados mais curtos são sons de felicidade, enquanto que pupilas dilatadas indicam medo. Se um gato estiver com os pêlos arrepiados e com a cauda ereta, indica medo e potencial agressão", diz Dodman.
Segundo Alexandre Rossi, especialista em comportamento animal e autor de livros com dicas de comportamento e adestramento, é importante lembrar que gatos são bichos de comportamento peculiar. "Há pessoas que levam um gato pra casa e esperam que ele se comporte como um cachorro, que não suba nos lugares e que obedeça a todas as ordens", afirma. No livro "Os Segregos dos Gatos" (recém-lançado pela Editora Globo), Rossi decifra algumas características específicas dos felinos. "O gato não obedece a uma ordem simplesmente por obedecer. Ele precisa confiar na pessoa e ter uma recompensa pela obediência. Enquanto os cães possuem predisposição natural para receber ordens, já que evoluíram de bandos em que a hierarquia era fundamental, gatos sempre foram caçadores solitários, nunca dependeram do grupo para sobreviver." Rossi também reforça a importância da educação do animal sem violência. "Cachorros são capazes de tolerar a agressão enquanto são adestrados e ainda assim continuam amando seus donos. Gatos, não."
A paciência com os hábitos felinos podem trazer recompensas para o dono. A primeira delas seria para a saúde. Segundo Dodman, os gatos ajudam a aliviar alterações negativas de humor em um nível equiparado apenas à companhia humana. Também auxiliam a diminuir a pressão arterial e o colesterol.
"ELES
NÃO SÃO ANTIPÁTICOS, MAS INSTINTIVOS"
Para Alexandre Rossi, autor de "Os Segredos dos Gatos", obsessão
pelo controle do território faz com que muitos pensem que os bichanos são
egoístas e que se importam mais com a casa do que com os donos.
De um lado, os gatos são considerados auto-suficientes a ponto de ignorar seus donos. Por outro, há quem defenda que eles são carinhosos como os cães. Para mostrar quem tem razão nessa história, Alexandre Rossi está lançando o livro "Os Segredos dos Gatos" (Editora Globo). Especialista em psicologia animal e autor de best sellers sobre cães, ele escreveu uma obra que, além de assuntos como características físicas e comportamentais e cuidados com alimentação e higiene, traz dicas sobre adestramento.
Galileu: O perfil do dono de animal de estimação vem mudando. Como os gatos têm acompanhado isso?
Alexandre Rossi: O gato é considerado o animal do futuro. Ele é capaz de se adaptar com muito mais facilidade à vida moderna. Hoje temos famílias pequenas, casas e apartamentos menores, e passamos grande parte do tempo fora do nosso lar. O cachorro sente muito a solidão; o felino, não. A pessoa pode trabalhar o dia todo, viajar no fim de semana, e o gato não sente tanto. Geralmente as pessoas que gostam mais de bichanos são as que querem um animal mais independente, que não seja tão grudado como o cachorro. Além disso, ele inspira mais liberdade, mais elegância e mais naturalidade justamente por não ser um animal tão domesticado.
Galileu: Há quem diga que os gatos só se aproximam das pessoas por interesse.
Rossi: Eu discordo. Há pessoas que acham que o gato se importa muito mais com a casa onde ele vive do que com os donos. Isso ocorre porque ele é obcecado por ter controle do território e, enquanto isso não acontece, ele fica incapaz de demonstrar afeição e carinho. Não há nada de antipatia, mas de instinto. No ambiente natural, o gato é predador, mas também é presa. Mesmo em casa, ele tem de saber pra onde ele pode fugir se acontecer algum problema e quais são as ameaças ao redor. Enquanto ele não domina o território, qualquer um que tentar impedi-lo de alguma ação poderá ter uma resposta agressiva.
Galileu: O que uma pessoa precisa saber antes de levar um gato para casa?
Rossi: Primeiro, que o gato é um animal que explora os ambientes tridimensionalmente. Ele sempre vai subir na pia, na geladeira, no microondas, e é importante que ele tenha esse acesso. Não adianta ter um gato e querer limitá-lo ao chão, como se fosse um cachorro. Muitos também pulam janelas, o que obriga o dono a colocar telas. Também é importante lembrar que alguns são bastante barulhentos durante o cio. A gata siamesa é a que mia mais alto nesse período. E é necessário também saber se a pessoa que pretende ter o gato não tem alguma reação alérgica à proteína que existe na saliva dele.
Galileu: Como no caso dos cães, há diferenças de comportamento entre as raças?
Rossi: O comportamento e a estrutura do gato não são tão variados quanto os dos cães. O siamês, por exemplo, costuma ser mais agitado e barulhento, enquanto o persa é mais tranqüilo e silencioso. Geralmente, os mais ativos acabam, por tentativa e erro, descobrindo e aprendendo mais coisas. Por isso, são considerados mais inteligentes.
Galileu: Quais são os principais desafios na hora de educar um gato?
Rossi: O gato é mais difícil de ser treinado, acima de tudo, porque ele deve ser educado em um ambiente que conheça. Você não pode pegar um gato e levar pra um lugar onde haja um treinador. Enquanto ele não estiver adaptado ao ambiente, não vai prestar atenção nas pessoas. Também é difícil porque carinhos e brinquedos não costumam ser boas recompensas para o gato; o petisco é mais usado, mas ele demora mais para comer, o que não permite tantas repetições de exercícios de treinamentos quanto com cachorros.
O gato não consegue ser educado com reforços negativos. Com cachorros, há reforços como colocar um enforcador e apertar o traseiro pra ele sentar. Se isso for feito com o gato, ele vai passar a não gostar da pessoa que o treina. Por outro lado, por meio do reforço positivo, o gato vai se aproximando, se tornando cada vez mais sociável. O cachorro ainda tolera a agressão porque depende muito do ser humano e é capaz de, mesmo assim, continuar amando o dono. O gato, não.
Na alegria e na tristeza
Introduzida no Brasil entre o final da década de 1940 e início da década de 1950 no tratamento de pacientes com esquizofrenia, a zooterapia, ou terapia assistida por animais, teve como seu primeiro colaborador o gato. Hoje, vários outros animais foram incluídos na prática. "O gato é mais sutil, mais reservado. De uma maneira geral, ele mede mais as conseqüências e respeita mais os limites dados pela pessoa. E isso influencia muito nas terapias", afirma psicóloga e veterinária Hannelore Fuchs.
Trabalhando com zooterapia há 15 anos, em São Paulo, ela coleciona casos bem-sucedidos. Uma vez por mês, Hannelore e a gata Frida visitam uma escola de educação especial em São Paulo. Com crianças, o foco do trabalho e dos estudos está ligado à cognição, à conduta e ao desenvolvimento físico e motor. Há casos de crianças com dificuldade em abrir as mãos que desenvolveram ou retomaram esse controle devido ao esforço feito para poder acariciar um gato.
Desde 1999, a professora Maria de Fátima estuda a interação entre homem e animais. "Com a zooterapia, observamos que essa interação melhora o ambiente social, a qualidade de vida do ser humano e, consequentemente, do animal." Segundo ela, o gato na zooterapia funciona como uma ponte entre paciente e terapeuta. No consultório de Hannelore, os animais ficam soltos e transitam entre uma consulta e outra. "Dependendo da afeição do paciente pelo gato, ele começa a fazer parte da consulta", diz a psicóloga.
Assim, casos como o de dona Luiza, a mulher do começo desta reportagem, estão se tornando cada vez mais comuns em asilos e entre idosos abandonados. "Para eles, o gato vira um desafio positivo", afirma Hannelore. "Gerenciam a rotina do animal, sentem-se responsáveis pela vida do bicho. Isso faz com que o idoso deixe um pouco o papel de ser cuidado e passe a ser o 'cuidador'. Por meio do convívio com o gato, a vida do idoso passa a ter uma motivação maior."
VÁ FUNDO
Para ler
•"All Cats Have Asperger Syndrome", Kathy Hoopmann. Jessica Kingsley Publishers. 2006
•"The Cat Bible: Everything Your Cat Expects You to Know",
Tracie Hotchner. Gotham Books. 2007
•"Entenda o Seu Gato", Bruce Fogle. Editora Globo. 2007
•"Gatos: a Emoção de Lidar", Nise da Silveira. Léo Christiano Editorial. 1998
•"Os Segredos dos Gatos", Alexandre Rossi e Paula Itikawa. Editora Globo. 2008
Textos sobre Gatos:
A Origem do Gato
Os primeiros animais mamíferos chamavam-se Creodontes e surgiram há
cerca de 60 milhões de anos atrás, e floresceram admiravelmente após a extinção
dos dinossauros.
O gato partilha com cães, ursos e outros mamíferos um ancestral comum -
uma criatura pequena, semelhante à doninha, de corpo comprido e pernas curtas,
chamada Miacis. Surgido dos creodontes há cerca de 50 milhões de anos e bem
adaptado a uma época hostil da história do planeta, o Miacis evoluiu e
prosperou, transformando-se na diversidade da moderna família de carnívoros que
hoje conhecemos.
Uma das ramificações do Miacis produziu os primeiros "gatos",
os Proailurus, que caminhavam com a planta dos pés no chão. Há cerca de 20
milhões de anos, o Proailurus deu lugar ao Pseudaelurus, que já caminhava nas
pontas dos dedos e possuíam poderosos caninos afiados.
Do grupo dos Pseudaelurus emergiram os antepassados diretos do atual
gato doméstico, os Felidae. Durante os milhões de anos seguintes, o Felidae
subdividiram-se em muitas subespécies, todas extraordinariamente aparentadas
com os gatos modernos.
Há doze milhões de anos atrás, surgiu o Felis lunensis, espécie européia
que se julga ser a antepassada direta da atual família de gatos selvagens,
sendo menores que seus predecessores.
Nesta época, os gatos modernos dividiram-se em dois grupos, os do Velho
Mundo e os do Novo Mundo.
Um grupo de felídeos selvagens, pequenos e independentes, espalhou-se
então pela Ásia, Europa e África.
Parentes dos gatos contemporâneos, eram criaturas sofisticadas,
construídas para sobreviverem. Pequenos, asseados, perfeitos carnívoros, os
gatos de então já possuíam garras retráteis, que podem ser consideradas uma
obra-prima da natureza, imprimindo maior velocidade na caça e contribuindo para
um bote mortífero.
A dentição do gato também evoluiu com perfeição, com dentes preparados
para segurar, furar, matar, cortar e reduzir a presa a pequenos pedaços
facilmente engolidos.
Com a domesticação, outras mudanças se perpetuaram, tanto físicas quanto
comportamentais. O cérebro diminuiu de tamanho, o sistema digestivo
modificou-se para adaptar-se a outro tipo de alimentação, a pelagem tornou-se
mais variada , e o temperamento bravio do gato sofreu uma alteração permanente,
para adequar-se ao convívio com o homem.
Fonte: Planeta Gato
O Que Os Gatos Fazem Por Nós
Olha quantas coisas os gatinhos nos proporcionam!
- Esquentam nosso colo e nos dão alguém para falar.
- Ajudam a baixar a pressão.
- Criam um elo entre você e as outras pessoas que têm gatos.
- Transformam objetos comuns em brinquedos.
- Nos faz mais atentas aos pássaros.
- Funcionam como alarme.
- Exibem acrobacias para você.
- Contribuem para tornar sua vida mais longa.
- Enfeitam o peitoril da janela.
- Mantém os ratos longe.
- Nos faz sorrir.
- Inspira os poetas e escritores.
- Nos ensina a ter os pés no chão.
- Nos faz deixar nossos desejos em segundo plano em prol de alguém.
- Aquecem nossas casas e nossos corações.
- Nos lembram de como a vida é misteriosa.
- Compartilham conosco o seu ronronar.
- Nos instruem na arte de se espreguiçar.
- Mostram-nos como levantar a poeira e dar a volta por cima.
- Fazem com que até nosso sofá velho pareça bonito.
- Abrem nossos corações.
Autoria Desconhecida
Das Qualidades do Gato
Quando Deus fez o mundo, escolheu enchê-lo de animais, e decidiu dar uma
qualidade especial para cada um. Todos os animais formaram diante Dele uma
longa fila, e o gato, calmamente, foi para o fim da fila.
Deus deu ao elefante e ao urso a Força, ao coelho e ao cervo a
Velocidade, a Sabedoria à coruja, Beleza aos pássaros e borboletas, Esperteza
para a raposa, Inteligência para o macaco, Lealdade para o cão, Coragem para o
leão, Alegria para a lontra... Todas estas coisas os animais haviam pedido para
ter.
Afinal, ao fim da fila, o pequeno gato sentou-se e esperou paciente.
Deus perguntou-lhe: - O que terá você?
Ao que o gato encolheu os ombros e respondeu: - Qualquer coisa me
servirá. Eu não ligo.
E Deus disse: - Mas eu sou Deus ! Quero lhe dar algo especial !
E o gato, espertamente, respondeu: - Então me dê um pouco de tudo, por
favor !
E Deus, rindo-se da enorme inteligência do animal, deu para o gato a
soma de todas as qualidades dos animais, mais a graça e a elegância, e um
gentil ronronar, para que ele sempre atraísse os homens e conquistasse seus
lares.
Autoria Desconhecida
Carta de Um Gato para Um Cão
Querido Amigo Cachorro,
Lamento muito que te mandaram pro Canil Municipal pelo abajur que tu não
quebraste, o peixe que tu não comeste, o tapete que tu não urinaste e pela
parede que tu não sujaste com tinta vermelha. Mas minha dona se deu conta do
trauma que tenho, por ter sido arrastado de casa até a beira de um barranco, o
qual tive que saltar para que tu não me jantasse, e das vezes que tive que me
esconder no banheiro para que tu não me encontrasse.
Enfim, as coisas aqui em casa estão muito mais tranqüilas, e para que
vejas que não existem rancores, te mando uma foto minha, para que não me
esqueças jamais.
Fraternos abraços
O Gato.
O Gato e o Folclore
Com seus grandes olhos que cintilam nas trevas, e sua espantosa
capacidade de sobrevivência, o gato sempre foi objeto de numerosos mitos e
superstições, inclusive o mito das suas nove vidas, iniciado no Egito, onde o
nove é um número mágico e os gatos são condutores da alma dos mortos. Seu
comportamento independente e a agilidade surpreendente despertaram idéias de
encantamentos e adivinhação, ligando-o para sempre no imaginário popular ao
mistério e à magia.
Mesmo em culturas em que foram adorados como divindades, os gatos não
escaparam à torturas e mortes terríveis, devidas a seus supostos poderes
sobrenaturais. Em diversas regiões do mundo, gatos eram enterrados por baixo
das plantações após morrerem por espancamento, que simbolizava o amaciamento
dos cereais. Acreditava-se que isto garantia colheitas abundantes, talvez pelo
antigo mito da fertilidade do gato, associado à deusa Bastet. Na Europa de
outrora, além de queimados nas fogueiras por feitiçaria, os gatos eram
emparedados vivos dentro de edifícios em construção, para que o prédio não
fosse atacado por roedores ou espíritos malignos. Gatos pretos foram
perseguidos por supostas ligações com o demônio. Originou-se daí a a crença, na
Inglaterra, de que um gato preto atravessando o caminho é sinal de boa sorte.
Boa sorte porque ele se foi e deixou de fazer-nos mal... Entretanto, na
América, a crença inverteu-se, passando o gato preto a representar perigo.
Ainda na Europa, acreditava-se que um gato com a pata por trás da orelha
ou bocejando era sinal de chuva e que um gato ronronando significava bom tempo.
Também no Camboja os gatos trazem a chuva, existindo mesmo um antigo ritual em
que um gato é levado de aldeia em aldeia e aspergido com água. No Japão, um
gato com a pata levantada é um dos símbolos da boa sorte, conhecido por
Maneki-Neko, e o gato é ainda hoje usado como talismã pelos marinheiros durante
as tempestades.
Na Tailândia, onde acreditava-se que as almas das pessoas muito
evoluídas migravam para o corpo de um gato e depois subia aos céus, havia um
ritual em que um gato era enterrado vivo junto com o morto. No túmulo havia um
buraco para que o animal saísse, e assim os monges sabiam que a alma já havia
penetrado em seu corpo.
Na China, atribuía-se aos gatos o poder de se vingarem dos seus
assassinos.
Fonte: Planeta Gato
O Gato e a Religião
Muito embora não seja onde em dia tão difundido, o culto aos animais
espalhava-se outrora pelo mundo. Mesmo os deuses que não possuíam forma animal
tinham um animal sagrado a eles dedicado, que os simbolizava. Entre estes
animais, o gato foi um dos mais adorados, tanto por sua fecundidade quanto por
seus hábitos noturnos, que o tornaram o guardião da noite, dos mortos, e dos
mistérios da vida e da morte.
O Culto Egípcio: No Egito dos faraós, o gato era adorado
na figura da deusa Bastet, representada comumente com corpo de mulher e cabeça
de gata. Esta bela deusa era o símbolo da luz, do calor e da energia. Era
também o símbolo da lua, e acreditava-se que tinha o poder de fertilizar a
terra e os homens, curar doenças e conduzir as almas dos mortos. Nesta época,
os gatos eram considerados guardiões do outro mundo, e eram comuns em muitos
amuletos.
O Gato na Grécia: Na Grécia clássica, o gato foi
associado à feminilidade, ao amor e ao prazer sexual, atributos de Afrodite.
Também foi associado à Artemis, a deusa da caça e da lua, da qual se dizia que
teria escapado um perseguidor, Tiphon, transformada em gata.
O Culto em Roma: No Império Romano, o gato esteve
ligado a várias deusas. Diana, a caçadora, governava a fecundidade e a lua,
assim como Bastet, e uma lenda antiga atribui a ela a criação do gato. Também a
sensual Vênus é representada como uma gata, uma encarnação de emoções maternas.
O Gato na Babilônia: Apesar de não haver culto ao gato,
dizia um mito que o gato teria nascido do espirro de um leão. O leão, aliás,
era um símbolo da realeza.
O Gato na América Pré-Colombiana : Na América, embora não houvessem gatos
domésticos, os grandes felinos, como o puma e o jaguar, tiveram seu lugar no
panteão dos deuses. O jaguar era símbolo de grande força e sabedoria, e
acreditava-se que os curandeiros mortos transformassem-se neste animal.
O Culto Celta: Na cultura celta, a deusa Cerridwen tem
um elo de ligação com o culto ao gato relativo à fecundidade através de seu
filho Taliesin, que em uma de suas encarnações foi descrito como um gato com a
cabeça sarapintada.
O Culto Escandinavo: Nas lendas nórdicas, aparece a deusa do
submundo Freya, cuja carruagem era puxada por dois gatos, que representavam as
qualidades da deusa, a fecundidade e a ferocidade. Estes gatos mostravam bem as
facetas do gato doméstico, ao mesmo tempo afetuoso e terno, e feroz quando
excitado. Os templos pagãos eram freqüentemente adornados com imagens de gatos.
Na Finlândia, havia a crença em um trenó puxado por gatos que levava as almas
dos mortos.
O Gato no Islã: Há uma série de contos associando os
gatos ao profeta Maomé, a quem teriam inclusive salvo da morte, ao matar uma
serpente que o atacava. Por causa desta associação entre o gato e o Islã, a
Igreja Católica conseguiu tanto êxito ao relacionar o culto ao gato com as
heresias e o demônio.
O Gato no Budismo: Nos cânones originais do budismo, o
gato é excluído da lista de animais protegidos, devido ao fato de que, no
momento da morte de Buda, quando todos os animais se reuniram para chorar seus
restos, o gato haver não só mantido os olhos secos como comido tranqüilamente
um rato, provando sua falta de respeito pelo acontecimento solene. Entretanto,
apesar da lenda, o gato foi venerado pelos primeiros budistas por seu
autodomínio e a tendência à meditação. Na China, estatuetas de gatos eram
usadas para expulsar os maus espíritos, e havia dois tipos de gatos, os bons e
os maus, que eram facilmente diferenciados por que os maus tinham duas caudas.
No Japão, quando um gato morria, era enterrado no templo do dono, e no altar do
mesmo era oferecido um gato semelhante, pintado ou esculpido, para garantir ao
dono tranqüilidade e boa sorte durante sua vida.
O Gato e o Judaísmo: No Talmude, o gato só aparece cerca de
500 d.C., quando o livro sagrado louva brevemente seu asseio. Entretanto, uma
antiga lenda hebraica conta que o gato teria sido criado em plena Arca, quando
Noé, em desespero por que os ratos estavam se multiplicando e devorando todas
as provisões, implorou à Deus que lhe enviasse uma solução. O gato então teria
sido criado de um sopro do leão. Outra antiga lenda judaico-espanhola diz que
Lilith, a primeira mulher de Adão, o teria deixado para se transformar em um
vampiro, que sob o aspecto de um gato preto, atacava bebês adormecidos e
indefesos e lhes sugava o sangue.
O Gato e o Cristianismo: A Igreja , no início de sua história,
adotou alguns símbolos pagãos e rejeitou outros. Assim, Jesus se tornou "o
Leão de Judá", e a serpente a égide do mal. Na seita dos coptas, surgida
por volta do século I d.C., havia no evangelho gatos que julgavam os homens
após a morte. A primitiva Igreja celta associou vários santos às tradições
pagãs e ao culto ao gato. Santa Gertrudes de Nivelles, por exemplo, é
representada sempre com um gato, e, na França, dizia-se que Santa Ágata
transformava-se em um gato enfurecido para punir os infiéis. Na Idade Média,
entretanto, a imagem do gato começou a mudar. No século V, os gnósticos, que
atribuíam igual importância a Jesus, Buda e Zoroastro, foram acusados de adorar
o demônio na figura de um gato preto. No ano de 1232, o papa Gregório IX funda
a Santa Inquisição, com o intuito de descobrir heréticos que cultuavam o
demônio, novamente na figura de um gato preto, macho. Em 1344, surge na França,
o culto de São Vito, em Metz, queimando vivos anualmente 13 gatos em uma
gaiola. Quando a Peste Negra atacou a Europa, dizimando quase um terço da
população, inicialmente os gatos foram considerados culpados e perseguidos,
ordenando-se a sua destruição. A associação da figura do gato ao culto ao
demônio levou inevitavelmente à sua vinculação à feitiçaria e às artes mágicas.
No século XV, na Alemanha, ressurgem cultos pagãos como o da deusa Freya. Em
1484, o papa Inocêncio VIII difunde a crença de que as feiticeiras veneravam
Satanás encarnado em gato. Por toda a Europa, pessoas inocentes foram
torturadas em nome de Deus. E, com elas, seus gatos. Em Ypres, na França,
centenas de gatos eram atirados do alto de um campanário em um festival anual.
Milhares de gatos foram sacrificados em rituais durante a Páscoa. A perseguição
chegou até mesmo à América, quando, em 1692, várias pessoas foram executadas em
Salem, no estado de Massachusetts. Entretanto, mesmo nestes tempos inglórios,
os gatos foram também companheiros amados em alguns países, como na Rússia,
onde eram comuns serem encontrados em conventos e mosteiros. O Cardeal
Richelieu possuía vários gatos, entre eles um angorá preto chamado Lúcifer. No
sul da França, corria a lenda dos gatos mágicos chamados matagots, que traziam
fortuna e sorte a quem os acolhia e amava. Com o passar do tempo, a perseguição
foi recrudescendo, e a importância dos gatos como controladores dos roedores
foi reconhecido. No século XVIII, são abolidas as leis sobre a feitiçaria, e
até mesmo o papa Pio IX rendeu-se aos seus encantos.
Fonte: Planeta Gato
Porque Os Gatos São Melhores Que As Pessoas
Gatos não se sentem ameaçados por uma mulher de cabelos curtos, ou um
homem de cabelos compridos.
Gatos não se preocupam se você é alegre ou divertido.
Gatos não se importam com que religião você tem.
Gatos não se preocupam com suas opiniões políticas.
Gatos não se sentem ameaçados se você ganha mais do que eles.
Gatos não se preocupam se você raspa as pernas ou não.
Gatos não vêem nenhum problema em demonstrar carinho pelo seu melhor
amigo.
Gatos não têm problemas para expressar afeto em público.
Gatos não se preocupam em usar a última moda.
Gatos não se incomodam se você usar a mesma camisa dias a fio.
Gatos não encherão a cara e desmaiarão no chão do banheiro.
Gatos não lêem o seu jornal, nem o recortam antes que você leia.
Gatos não se vangloriam das suas conquistas amorosas.
Gatos não corrigem suas histórias.
Gatos nunca reclamam que você não os acaricia o suficiente.
Gatos não reclamarão se você não faz a cama ou o faz de qualquer jeito.
Gatos não se incomodam se a tampa do vaso está abaixada ou não.
Gatos não criticam seus amigos.
Gatos não se sentem ameaçados pela sua inteligência.
Gatos não mentem nunca pra você.
Gatos não inventam histórias.
Gatos não praticam matanças contra sua própria espécie.
Gatos não ligam se você tem o hábito de controlar tudo.
Gatos nunca irão te bater.
Gatos não censuram sua imaginação.
Gatos são sempre limpos.
Gatos raramente interferem nos direitos dos outros.
Gatos não se incomodam com o seu peso.
Gatos nunca usarão drogas ou formarão uma quadrilha.
Gatos nunca tomarão posse do seu controle remoto.
Autoria Desconhecida
Manual dos Gatos
Faça do mundo o seu playground.
Sempre que não der tempo de ir até a caixa sanitária, cubra com qualquer
coisa! Meias resolvem satisfatoriamente.
Quando estiver com fome mie bem alto! Eles o alimentarão apenas para
fazê-lo ficar quieto.
Sempre encontre algum raio de sol e cochile nele.
Cochile sempre.
Quando estiver encrencado, apenas ronrone e faça cara de
"lindinho".
A vida é muito difícil, então cochile.
A curiosidade nunca matou nada, a não ser umas poucas horas.
Quando na dúvida, finja saber o que está fazendo.
O tempero da vida é variar. Um dia, ignore as pessoas, no outro as
chateie.
Suba na vida, é para isso que as cortinas servem.
Deixe sua marca no mundo, ou ao menos borrife em cada canto.
Seja sempre generoso, um passarinho ou camundongo deixado na cama diz a
eles "eu me importo".
Autoria Desconhecida
O Gato Feio
Todos no prédio de apartamentos onde eu morava sabiam quem era o Feio.
Feio era o gato vira-lata do bairro.
Feio adorava três coisas neste mundo: brigas, comer lixo e digamos,
amor. A combinação destas três coisas, adicionada a uma vida nas ruas, tinham
causado danos em Feio.
Pra começar, ele só tinha um olho, e no lugar onde deveria estar o outro
olho, havia um buraco fundo. Ele também havia perdido a orelha do mesmo lado, e
seu pé esquerdo parecia ter sido quebrado gravemente no passado, e o osso
curara num ângulo estranho, fazendo com que ele sempre parecesse estar virando
a esquina. Feio havia perdido a cauda há muito tempo, e restava apenas um toco
de cauda grosso, que ele sempre girava e torcia.
Todos que viam Feio tinham a mesma reação:
"Mas que gato feio!"
As crianças eram alertadas para não tocarem nele. Os adultos atiravam
pedras nele, jogavam-lhe água com a mangueira para espantá-lo, o enxotavam
quando ele tentava entrar em suas casas, ou imprensavam suas patas na porta
quando ele insistia em entrar.
Feio sempre tinha a mesma reação.
Se você jogasse água nele com a mangueira, ele não saía do lugar, ficava
ali sendo ensopado até que você desistisse. Se você atirasse coisas nele, ele
enroscava seu corpinho magricela aos seus pés, pedindo perdão.
Sempre que via crianças, ele surgia correndo, miando desesperadamente e
esfregando a cabeça em todas as mãos, implorando por amor. Quando eu o apanhava
no colo, ele imediatamente começava a sugar minha blusa, orelhas, ou o que
encontrasse pela frente.
Um dia, Feio quis dividir seu amor com os huskies do vizinho. Eles não
eram amistosos e Feio foi ferido gravemente. Do meu apartamento, eu ouvi seus
gritos e corri para tentar ajudá-lo.
Na hora em que cheguei onde ele estava caído, parecia que a triste vida
de Feio estava se esvaindo...
Feio estava caído em uma poça, suas pernas traseiras e suas costas
estavam totalmente disformes, um corte fundo na listra branca de pêlo
atravessava seu peito. Quando eu o apanhei e tentei levá-lo para casa, ele
fungava e engasgava, podia senti-lo lutando para respirar.
"Acho que o estou machucando muito", eu pensei. Então, eu
senti a sensação familiar de Feio chupando minha orelha - em meio a tamanha
dor, sofrendo e obviamente morrendo, Feio estava tentando sugar minha orelha.
Eu o puxei para perto de mim e ele esfregou a cabeça na palma da minha
mão, olhou-me com seu único olho dourado e começou a ronronar.
Mesmo sentindo tanta dor, aquele gatinho feio, cheio de cicatrizes de
suas batalhas, estava pedindo um pouco de carinho, talvez alguma comiseração.
Naquele instante, achava que Feio era o gato mais lindo e adorável que eu já
tinha visto. Em nenhum momento, ele tentou me arranhar ou morder, nem mesmo
tentou fugir de mim, ou rebelou-se de alguma maneira. Feio apenas olhava para
mim, confiando completamente que eu aliviaria sua dor.
Feio morreu em meus braços antes que eu entrasse em meu apartamento.
Eu me sentei e fiquei abraçada com ele por muito tempo, pensando sobre
como este gato vira-lata deformado e coberto de cicatrizes havia mudado minha
opinião sobre o que significava a genuína pureza de espírito e sobre como amar
incondicionalmente. Feio me ensinara mais sobre doação e compaixão do que
qualquer ser humano.
E eu sempre lhe serei grata por isto.
Chegara
a hora de eu seguir em frente e aprender a amar verdadeira e
incondicionalmente. Chegara a hora de dar meu amor para aqueles que me eram
caros, mesmo que meus olhos nunca tivessem visto nenhum deles...
As
pessoas acham mais fácil e mais prazeroso amar o belo, o perfeito, sem notarem
que os feios, os tortos, os mancos, enfim os deformados sejam de corpos, mentes
ou almas, também podem e merecem serem amados...
Se vocês pudessem avaliar ou sentir como é quente e gostoso o abraço de
alguém feio e antipático, de alguém deformado e que foge as regras e padrões de
beleza...
se vocês se permitissem essa sensação, talvez entenderiam e veriam os
tantos "gatos feios" que a vida lhes coloca diante dos seus olhos
todos os dias e vocês se negam a enxergá-los...
Muitas pessoas querem ser influentes, querem acumular dinheiro, querem
ser bem sucedidas, queridas, simpáticas ou belas... Quanto à mim, eu sempre
tentarei ser como o Feio...
Passarei minha vida pedindo amor, mendigando um pouco do seu tempo,
esperando pelo seu carinho, contando com sua compreensão, e pacientemente
aguardando o dia de ser devorada pelos "Huskies"...
Se tiver sorte terei alguém que me pegue no colo e me faça um carinho
antes do meu último suspiro...
Neste mundo cheio de intolerâncias devemos espalhar mais respeito aos
demais seres viventes, sejam eles da mesma raça, mesma religião, mesma etnia
que nós , ou não, sejam feios ou bonitos aos nossos olhos tão desacostumados a
ver, ou nossos ouvidos, que ainda não aprenderam a ouvir a real mensagem de
Deus.
Autoria Desconhecida
O Gato Que Voltou
"Alguns dizem que os animais não tem alma e são incapazes de ter
emoções. Essas pessoas estão terrivelmente erradas. Animais são totalmente
capazes de amar pessoas que são boas para eles, e podem mostrar esse amor de
maneiras inesperadas e às vezes impossíveis. A minha história é uma prova
disso.
Eu amo gatos. Meu filho sempre me falou que gatos, de algum jeito, sabem
que eu vou ajudar eles quando estão doentes ou machucados. E de um jeito,
talvez ele esteja certo. Gatos de rua aparecem na minha varanda, parecendo
saber que eu vou alimentá-los e limpá-los antes de mandarem eles embora. Eu
sempre tenho um pouco a mais de spray anti-pulgas, remédio para verme ou alguma
pomada antibiótica para quaisquer necessidade médicas que os meus amiguinhos
peludos possam ter. E as vezes aparece algum gato que fique um tempo conosco
antes de ir embora. Essa história é sobre um desses. Ele veio da rua para as
nossas vidas, e ficou tempo o suficiente para mudar totalmente o nosso modo de
pensar.
Meu filho e eu vivíamos em um péssimo apartamento por cerca de 2 anos. O
prédio ficava na periferia de uma cidade rural e bem próximo a alguma fazendas.
Pessoas de uma cidade grande vizinha geralmente abandonavam animais que não
queriam mais na nossa cidade, e as fazendas tinham bastante gatos no celeiro e
cachorros. O nosso síndico (que era o dono do apartamento em que morávamos)
odiava animais. Não era permitido ter animais no prédio, e ele era suspeito no
desaparecimento de vários animais da vizinhança. Eu o ouvi uma certa vez se
gabando de ter enxotado a tiro alguns gatos de rua e de soltar o cachorro de
uma vizinha. Então sempre que um gato aparecia na nossa varanda, eu o
alimentava e tratava dos seus ferimentos, mas não deixava eles entrarem por
causa do síndico.
Depois de cerca de um ano morando lá, um gato todo preto começou a
visitar o meu apartamento. Ele só vinha de noite, como se soubesse que assim
não seria visto. O meu filho falou que já tinha visto o gato em uma velha casa
a cerca de meio quilômetro de casa. Nós achamos que devia ser mais um gato
abandonado por donos irresponsáveis, então o alimentamos e ocasionalmente
limpávamos ferimentos de brigas e tirávamos carrapatos da pele dele. Aquele
gato ficava ronronado e se esfregando nas nossas pernas para que nós fizéssemos
carinho nele. Ele era uma animal adorável.
Normalmente nós não nos apegávamos muito aos gatos, com medo de que o
síndico machucasse eles ou que nós fôssemos despejados. Mas nós abrimos uma
exceção para esse gato. Ele era especial. Meu filho comprou para ele uma
coleira rosa choque de nylon com um sino. Com uma caneta azul para tecido ele
escreveu "Gato" na coleira e colocou no gato preto. Ele estava
maravilhoso com a sua coleira nova, e o nosso relacionamento com ele estava
maravilhoso. Nós tínhamos um gato para acariciar e ele tinha comida todas as
noites, e ainda era livre para ser um gato e ir para onde ele quisesse. E o
síndico não tinha nem idéia.
Nós decidimos que "Gato" era um bom nome para ele, ele não
parecia querer algo mais chique. Somente Gato já estava bom demais. Gato
continuou com a sua visita noturna por meses. Sempre que ficava escuro, ele
começava arranhar a porta da varanda e a miar até que nós abríssemos a porta
para ele entrar e ser acariciado. Se nós ficássemos fora de casa até tarde, ele
esperaria na varanda até chegarmos, comia a sua comida, aproveitava alguns
carinhos e seguia o seu caminho.
Alguns meses mais tarde, eu decidi voltar para a faculdade e nós tivemos
que nos mudar do apartamento para morar com alguns parentes para cortar
despesas. Meu filho não queria deixar Gato e me implorou para levarmos ele. Eu
tive que ser firme com ele e dizer que não poderíamos levar um gato para a casa
dos outros. Mas toda noite quando Gato visitava, eu podia sentir que eu
fraquejava.
Então uma noite Gato não apareceu. Nós esperamos por ele por um tempo,
então fomos para a cama. Ele não veio na noite seguinte e nem na outra.
No dia seguinte nós começamos a colocar todas as nossas coisas em um
caminhão de mudanças alugado. Nós nos mudaríamos no dia seguinte de manha bem
cedo. Meu filho e eu estávamos cozinhando o jantar pela última vez no
apartamento. O fogão nunca tinha funcionado direito, e eu tinha que acender ele
com um fósforo. Nós estávamos falando de como ia ser bom morar em um lugar onde
o fogão funcionasse direito. Eu coloquei a pizza no forno e então sentamos na
mesa da cozinha e começamos a jogar baralho esperando a pizza ficar pronta. A
mesa, as duas cadeiras, os pratos de papel e os talheres de plástico eram tudo
o que tinha sobrado no apartamento. O resto já estava todo no caminhão. Nós
tínhamos planejado comer, dormir no chão da sala em sacos de dormir e depois ir
no dia seguinte.
Um pouco depois que estávamos sentados na mesa, eu ouço o som familiar
da porta da varanda sendo arranhada. "Gato!!!" o meu filho e eu
pulamos das cadeiras e fomos para a sala para abrir a porta e saudar o nosso
amiguinho peludo. Nós ficamos lá fora na varanda brincando com ele. "Nós
estávamos preocupados com você!" o meu filho falou, enquanto gato
esfregava a sua cabeça no rosto dele. Nós estávamos lá fora coçando as orelhas
dele quando veio um grande clarão de dentro de casa junto com um estrondo. O
fogão da cozinha tinha explodido!
Os bombeiros vieram e apagaram o fogo e a companhia de gás veio e fechou
o encanamento. Vendo o velho fogão, o bombeiro falou que aquilo era um acidente
esperando para acontecer. Nós tínhamos sorte por estarmos vivos. A mesa e as
cadeiras da cozinha estavam totalmente queimadas. Se nós estivéssemos lá
jogando baralho nós estaríamos com queimaduras graves, isso se não tivéssemos
morrido na hora.
Enquanto os bombeiros estavam em casa, o meu filho estava em choque
segurando Gato e coçando as suas orelhas. Se Gato não tivesse ali, meu filho ia
estar marcado para o resto da vida com cicatrizes que pegariam o seu corpo
todo, ou coisa pior.
Eu me decidi ali mesmo. Nós tínhamos uma velha gaiola para gato de
quando nós tínhamos a nossa casa e animais, eu tinha guardado ele caso a gente
precisasse algum dia. Estava no caminhão. Eu fui até lá e peguei ela.
"Coloque Gato ai dentro, nós vamos levar ele conosco" eu
falei, enquanto o meu filho sorria animado, por não ter de deixar o seu amigo
pra trás. O sino da coleira tocava enquanto o meu filho colocava Gato na gaiola
e trancava a portinha.
O que tinha sobrado na cozinha do apartamento estava em ruínas, e o
resto já estava no caminhão, então decidimos simplesmente ir embora naquela
noite. A gaiola estava no banco entre meu filho e eu. Enquanto eu ligava o
caminhão, eu coloquei o dedo dentro da gaiola e comecei a coçar a orelha de
Gato. Eu podia ouvir ele ronronando.
"É Gato, você está vindo com a gente. Você salvou as nossas
vidas." eu falei para ele. Nós nos despedimos dos vizinhos e fomos para a
rua e continuamos até chegar a uma placa de "pare" que tinha na
entrada da estrada.
Então eu vi algo que fez o meu sangue gelar. No acostamento da estrada
tinha um gato preto atropelado. Eu falei para o eu filho ficar no caminhão e
sai. O gato tinha sido atropelado a pelo menos uns dois dias, pois o corpo já
estava em decomposição. Em volta do pescoço do gato tinha uma coleira rosa
choque com um sino com as letras inconfundíveis do meu filho "Gato"
em azul.
Eu estava em choque. Como Gato podia estar ali morto no lado da estrada,
quando ele estava com a gente, com a coleira rosa e tudo, dentro do caminhão,
dentro da gaiola?
Eu voltei para o caminhão. Eu abri a porta e entrei na cabine e olhei a
gaiola.
Estava vazia.
Nós realmente acreditamos que Gato voltou para salvar as nossas vidas, e
depois seguiu em frente para o paraíso dos gatos."
Rosana-RO
O Gato Zen
O Homem estava muito triste. Sabia que os dias do Gato estavam contados.
O médico havia dito que não havia mais nada a fazer, que ele deveria levar o
Gato para casa, e deixá-lo o mais confortável possível.
O Homem acariciou o Gato em seu colo e suspirou. O Gato abriu os olhos,
ronronou e olhou para o Homem. Uma lágrima escorreu pela face do Homem e caiu
na testa do Gato. O Gato lhe lançou um olhar ligeiramente irritado.
"Por que você está chorando, Homem?", perguntou. "Porque
não suporta a idéia de me perder? Porque acha que nunca vai poder me
substituir?"
O Homem fez que sim com a cabeça.
"E para onde acha que eu irei quando deixar você?", o Gato
perguntou.
O Homem deu de ombros, sem saber o que dizer.
"Feche os olhos, Homem", disse o Gato. O Homem o olhou sem
entender bem, mas obedeceu.
"De que cor são meus olhos, meu pêlo?", o Gato perguntou.
"Os olhos são dourados e o pêlo é marrom, um marrom intenso e
vivo", o Homem respondeu.
"E em que parte do corpo tenho pêlos mais escuros?", o Gato
perguntou.
"Nas costas, no rabo, nas pernas, no nariz e nas orelhas",
disse o Homem.
"E em que lugares você mais costuma me ver?", perguntou o
Gato.
"Eu vejo você... no parapeito da janela da cozinha, observando os
passarinhos... na minha cadeira preferida... na escrivaninha, deitado em cima
dos papéis de que eu preciso... no travesseiro ao meu lado, à noite".
O Gato assentiu.
"Você consegue me ver em todos esses lugares agora, mesmo de olhos
fechados?", perguntou.
"Claro. Vi você neles por muitos anos", o Homem disse.
"Então, sempre que você quiser me ver, tudo o que precisa fazer é
fechar os olhos", disse o Gato.
"Mas você não vai estar lá de verdade", respondeu o Homem com
tristeza.
"Ah, é mesmo?", disse o gato. "Pegue aquele barbante do
chão - ali, meu 'brinquedo'".
O Homem abriu os olhos, esticou o braço e pegou o barbante. Tinha uns 60
centímetros e o Gato conseguia se divertir com ele por horas e horas.
"De que ele é feito?", o Gato perguntou.
"Parece que é de algodão", o Homem disse.
"Que vem de uma planta?", perguntou o Gato.
"Sim," disse o Homem.
"De uma só planta ou de muitas?"
"De muitos algodoeiros," o Homem respondeu.
"E seria possível que outras plantas e flores nascessem no mesmo
solo do algodoeiro? Uma rosa poderia nascer ao lado do algodão, não?",
perguntou o Gato.
"Sim, acho que seria possível", disse o Homem.
"E todas as plantas se alimentariam do mesmo solo e da mesma chuva,
não é?", o Gato perguntou.
"Sim", disse o Homem.
"Então, todas as plantas, a rosa e o algodão, seriam muito
parecidas por dentro, mesmo aparentando ser muito diferentes por fora",
disse o Gato.
O Homem concordou com a cabeça, mas não conseguia entender o que aquilo
tinha aver com a situação.
"E então, aquele barbante", disse o Gato, "é o único
barbante do mundo feito de algodão?"
"Não, claro que não", disse o Homem, "foi tirado de um
rolo de barbante".
"E você sabe onde estão todos os outros pedaços de barbante, e
todos os outros rolos?", perguntou o Gato.
"Não, não sei... seria impossível saber", disse o Homem.
"Mas mesmo sem saber onde estão, você acredita que eles existem. E
mesmo que alguns pedaços de barbante estejam com você, e outros estejam em
outros lugares... mesmo que alguns sejam curtos e outros sejam compridos, e
mesmo que seu rolo de barbante não seja o único no mundo... você concorda que
há uma relação entre todos os barbantes?", o Gato perguntou.
"Nunca tinha pensado nisso, mas acho que sim, há uma relação",
o Homem disse.
"O que aconteceria se um pedaço de barbante caísse no chão?",
perguntou o Gato.
"Bom... ele ia acabar enterrado, e se decompondo na terra", o
Homem disse.
"Sei", disse o Gato. "E talvez nascesse mais algodão
naquele lugar, ou uma rosa".
"Pode ser", concordou o Homem.
"Quer dizer que a rosa no parapeito da janela pode ter alguma
relação com o barbante na sua mão, e também com todos os barbantes que você
nunca viu", disse o Gato.
O Homem franziu a testa, pensando.
"Agora pegue uma ponta do barbante em cada mão", instruiu o
Gato.
O Homem fez o que foi pedido.
"A ponta na mão esquerda é o meu nascimento, e a na mão direita é
minha morte. Agora junte as duas pontas", disse o Gato.
O Homem obedeceu.
"Você formou um círculo contínuo", disse o Gato. "Alguma
parte do barbante parece diferente, melhor ou pior que qualquer outra parte
dele?"
O Homem examinou o barbante e então fez que não com a cabeça.
"O espaço dentro do círculo parece diferente do espaço fora
dele?", o Gato perguntou.
De novo, o Homem fez que não com a cabeça, mas ainda não sabia se estava
entendendo onde o Gato queria chegar.
"Feche os olhos de novo", disse o Gato. "Agora lamba a
mão".
O Homem arregalou os olhos, surpreso.
"Faça o que eu digo", disse o Gato. "Lamba a mão, pense
em mim em todos os meus lugares costumeiros, pense em todos os pedaços de
barbante, pense no algodão e na rosa, pense em como o interior do círculo não é
diferente do exterior".
O Homem se sentiu bobo, lambendo a mão, mas obedeceu. Ele descobriu o
que um gato deve saber, que lamber uma pata é muito relaxante, e ajuda a pensar
mais claramente. Continuou a lamber, e os cantos da boca começaram a esboçar o
primeiro sorriso que ele dava em muitos dias. Esperou que o Gato lhe mandasse
parar mas, como este não mandou, abriu os olhos. Os olhos do Gato estavam
fechados. O Homem acariciou o pêlo marrom, quente, mas o Gato havia morrido.
O Homem cerrou os olhos com força e as lágrimas começaram a escorrer
pelo seu rosto.
Viu o Gato no parapeito da janela, na cama, deitado em cima dos papéis
importantes. Ele o viu no travesseiro ao seu lado, viu os olhos dourados
brilhantes, e o marrom mais escuro no nariz e nas orelhas. Abriu os olhos e,
por entre as lágrimas, olhou para a rosa que crescia em um vaso na janela, e
depois para o barbante que ainda segurava apertado na mão.
Um dia, não muito depois, tinha um novo Gato no colo. Era uma linda gata
malhada... tão diferente do seu querido Gato anterior mas, ao mesmo tempo, tão
parecida.
Tradução:
Daniela Travaglini
Copyright ©
2001 by Jim Willis. Todos os direitos reservados.
Copyright da tradução brasileira © 2003 by Lugano Editora
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